domingo, 29 de maio de 2011

Erik Erikson- Estádios de Desenvolvimento - Estudo de caso

Por opção própria, entrevistei a minha avó materna, uma idosa (76 anos), que encara a vida de uma forma bastante positiva, levando um estilo de vida saudável, desenvolvendo várias relações de amizade e realizando competências de lazer, favorecendo assim, o seu auto-conceito positivo. Todos estes factores traduzem-se num envelhecimento óptimo, que é encorajado pela família, amigos e vizinhos.

A minha avó nasceu no ano 1935. Apesar de ter perdido o pai muito cedo (4 anos) e estar dentro da conjuntura da II Guerra Mundial (influência normativa histórica), vivenciou uma infância feliz e equilibrada, devido a um suporte familiar coeso, constituído pela mãe, avó, irmãos e tios.

Durante a puberdade, chega à compreensão da sua singularidade como pessoa, adquirindo a noção de que é um ser único, com identidade própria, mas inserida no seu meio social, onde continuava a ter vários papeis a desempenhar: ser jovem, amiga, filha, estudante e “ líder de bairro”, etc. tudo numa única imagem. Assim, começa a ter consciência que quer uma vida diferente, demonstrando confiança, autonomia, iniciativa e diligência (adquirida nos estádios anteriores) que se repercute nesta etapa da sua vida. É a partir desta única imagem formada de si própria e em função dela, que escolhe ir para Moçambique, começar um novo estilo de vida e uma carreira profissional.

Esta fase da vida da minha avó, constitui a transição para a vida adulta, visto que acabou a escolaridade, começa a trabalhar, adquire independência financeira e vive separada da família. Nesta altura, conhece o meu avô, que depois de um ano de namoro decidem casar-se. Ela está agora preparada para estabelecer laços de bem-querer, amizade, partilha e confiança. Como estudei, a intimidade requer que o sentimento de identidade pessoal facilite o relacionamento com outrem, numa base de compromissos, alteração de hábitos e mesmo a aceitação de sacrifícios. Com o meu avô, ela partilha a vida e tem duas filhas. Consegue assim, as virtudes desenvolvidas nesta fase: o amor e afiliação.

Com a descolonização, aos seus 42 anos, retornou a Portugal com o marido e filhas já adolescentes. Nesta fase, apesar de ter sido um período conturbado pela mudança de país, de emprego, de ambiente e amigos, continuou a ter uma vida conjugal e profissional estável (era funcionária pública). Esta estabilidade, funcionou na minha avó, como uma “mola” para desenvolver actividades que considerava produtivas e úteis, tais como actividades sociais com os mais pobres, preocupação com os mais jovens, com o bem – estar dos que a rodeiam e o desejo de contribuir para um mundo melhor, desenvolveram potencialidades do “eu” e incrementaram a sua afirmação pessoal.

As virtudes adquiridas neste estádio, são essencialmente a produção e ajuda aos outros (generatividade) ao contrário da estagnação onde o adulto só se preocupa consigo próprio, em que nada se assemelha à atitude da minha avó!

Entre os seus 50/55 anos de idade a minha mãe e a minha tia casam, deixando assim

a casa da minha avó. Conta ela, que nunca se sentiu tão só e deprimida pois achava que já não fazia parte da vida das filhas. Com o tempo, com a ajuda do meu avô, das próprias filhas e de todas as actividades em que participava, conseguiu alterar esta concepção e até começar a achar graça à nova liberdade, ao tempo disponível e mais tarde até o facto de ser avó.

Neste momento, a minha avó tem setenta e seis anos, é reformada da função pública e continua a ter diversas actividades. Pertence a várias associações, faz voluntariado no hospital de Ovar e através destas actividades compensatórias aumenta o seu sentimento de altruísmo e de competência. Faz muitos passeios promovidos para a idade sénior estabelecendo uma associação explícita com o seu grupo de idade. É uma avó jovem, cheia de vitalidade, satisfeita porque considera que a sua vida teve mérito e que continua com uma vida preenchida. Surge aqui o sentimento de integridade própria, pois é uma pessoa que ao longo da vida reuniu imensas experiências que levam nesta idade a ter como principal virtude, a sabedoria. Claro que sabemos que já existe uma pequena diminuição da força física e da saúde, própria desta idade, mas ela procura alternativas e maximiza as suas competências compatíveis com os recursos físicos que tem disponíveis (amadurece a ideia de ingressar na universidade sénior para o ano que vem).

A fase mais complicada da sua vida foi a morte do meu avô, pois o estado de sofrimento agudo e a tentativa de se adaptar a perda, levou a algumas alterações de saúde, e durante um ano, ano e meio notamos uma tristeza a que não estávamos habituados. Depois (num segundo estádio) sentimos que se adaptava gradualmente à nova vida sem o meu avô. Felizmente, como reformada da função pública, tem uma vida financeira adequada, tem carro que ainda conduz o que a torna independente física e financeiramente, apesar de continuar sempre muito ligada às filhas e aos respectivos netos com quem partilha as fases piores e melhores do seu novo estádio. A minha avó é emocionalmente dependente da família, assim como esta é dependente dela, constituindo uma relação de amor e respeito recíproco. Deste modo, assume os quatro papeis simbólicos tão preponderantes no seio da nossa família: estabilizador, guarda nacional da família, arbitro e historiador familiar.

Como guarda nacional da família tem sempre a preocupação de proteger e ajudar tanto os mais velhos como os mais novos, tanto financeiramente como através de conselhos sábios. Estes conselhos foram cruciais no desenvolvimento da minha adolescência, visto que sempre foi a minha principal confidente

Assim, mantém um estilo de vida saudável, através de bons hábitos de nutrição; exercício físico e envolvimento em actividades interessantes que desafiem em mente (realização de competências de lazer, praticas de solidariedade, universidade para seniores, …) que não requerem o uso substancial da força ou endurance física.

Concluindo, podemos verificar que a minha avó enfrentou de uma forma positiva as crises psicossociais postuladas por Erik Erikson, desenvolvendo virtudes importantes para o desenvolvimento humano, que mais tarde (actualmente) contribuem para um envelhecimento óptimo. Este testemunho ajudou-me a contrariar algumas crenças ou mitos que ainda persistem na nossa sociedade, de que as pessoas idosas são pobres, dependentes, tristes e sós e que não têm a capacidade de se divertirem. Pelo contrário, são pessoas maduras, que possuem uma inteligência altamente cristalizada e que têm muito para nos ensinar!

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